
O MAR É MEU PAI
lucas hugueney - 03/2023
O Mar é meu pai, e disso poucos sabem. Foi nele que me criei, e com sua presença me tornei gente. Passei toda minha vida tentando navegá-lo, tentando dançar em conjunto, e embora muitas vezes eu tenha falhado, sinto que nada foi (e continua a ser) tão importante como estar em sua presença.
O Mar é meu pai, e embora tenha sido outros, sempre voltará a sê-lo. Para mim, sua profundeza nunca foi o ventre que nutre e protege, mas o abismo que afoga e te faz querer ser melhor. É o símbolo da persistência da vida, da superação, e acima de tudo, do respeito mediante o silêncio.
A minha vivência me fez perceber que o Mar não ensina como uma mãe. Nunca foi uma questão de chances, de acolhimento, de uma fúria pedagógica. O Mar ensina pela indiferença, e te lança - como quem não se importa - à compreensão do vazio. Ele diz com todas as letras: "se não fizeres por ti, ninguém o fará", e com isso molda heróis.
O Mar é meu pai, e me mostrou que aquele que nega a superfície morre cedo. É necessário reconhecer o próprio habitat para entender as regras do jogo. Mas o que mais me estranha é que sempre houve uma misteriosa sensação de pertencimento ali, mesmo que, de forma clara e distinta, diante dele nunca tenha me sentido confortável. O Mar é mais arena, rito iniciático, do que propriamente um lugar para se chamar de 'meu'.
Durante toda a história que o tempo arrasta, o Mar diz muitas coisas a muitas pessoas e desde os primórdios ele é visto como princípio. Por isso, seja meramente pelo inconsciente coletivo que me ancora, seja pela peculiaridade do andar da minha vida, eu repito: o Mar é meu pai, e sendo pai, é princípio sem ser geração, é início sem ser criador, é estrutura sem ser aparente.
Aqueles que adentram a desfrutá-lo
em qualquer condição
entendem que a cada experiência da vida a única saída
é se tornar
cada vez mais sábio, cada vez mais,
e que tal sabedoria não pode vir do conhecimento que se tem dele,
apenas de sua presença infinita.




